terça-feira, 6 de maio de 2008

Auf wiedersehen *

Conheci-o nos meus vintes.
Eu tinha toda a ingenuidade e vontade de viver típica da idade. Ele tinha toda a alegria de viver de alguém que já tinha passado por muitas etapas de uma vida cheia de brilho. De festa.
Eu achava-o um menino que se tinha esquecido de crescer. Embebido num sorriso aberto, num discurso enigmático que a mim parecia um recado sempre mais complexo do que conseguia entender.

Atribuía aos menos vintes essa incapacidade ao mesmo tempo que condenada o chapéu desfasado. Naquele tempo, era tempo de criticar tudo o que não se compreendia e sempre o que nos metia medo por não se compreender. Então aquelas botas lilás…
Por culpa de uma timidez que só agora consigo dominar perdi a grande oportunidade de sorver mais o sorriso e a sabedoria do doutor boémio. Do homem que marcou a memória de tantos espaços, de tantas festas, de tantas noites que não teriam a mesma magia sem a presença do Aires.
O Rui. O Rui de uma geração de anfitriões que já não há. Daqueles que nos faziam sentir em casa em cada noite. Daqueles que criam uma história em cada copo, mesmo que ele fosse só isso: mais um copo de mais uma noite.

Há coisas assim na noite que só podem ser, que só existem dentro dela… Há pessoas de quem gostamos assim, de graça sem que a cumplicidade ou que a amizade sejam mais do que circunstanciais e tão turvas quanto o avançar da hora.
Único na forma de estar, único em cada conversa, único numa forma de viver noite que existe cada vez menos e que perde, assim, mais um bocadinho de magia.
Soube por SMS. Corria curta e fria em todos os telemóveis nessa sexta-feira. Ao princípio pousamos os copos. Não queríamos acreditar. É uma mania humana esta de querer negar o que já se tem como inevitável.

E no meio dos rostos incrédulos alguém começou imediatamente a trautear: “Parapapa!”
Nunca soube, talvez ainda por ingenuidade ou pela timidez me ter feito perder o episódio, o que o Rui queria dizer com este “Parapapa!”, mas dizia. Dizia muitas vezes. Tantas que tenho o jeito na memória. A voz na memória. O sorriso na memória.

A vida não deixa de ser irónica, quando minutos depois o mash up assinado por Henri Josh com Dirty South e Elite Troops rebenta nas colunas. Toda a gente canta em uníssono: “Parapapapapaa!” e de repente sabemos que essa tua magia está cá. Que tu, Rui, com os teus chapéus e botas lilás estarás sempre cá, enquanto para alguns de nós a noite for só e sempre uma festa. Adeus e sempre, para sempre, um muito obrigada.